Tendo em conta os enormes prejuízos desportivos e financeiros que a nossa formação de futebol está a ter com a pandemia, quais as perspectivas nos vários escalões de formação para o que resta da época?
As perspectivas são as melhores, atendendo às feridas profundas que este período pandémico poderia efectivamente provocar. Os nossos atletas são acompanhados pelo corpo técnico e clínico do clube numa base diária. Porém, confesso que temos algumas algumas questões que nos preocupam pois apenas com o retomar da actividade competitiva é que poderemos aferir com maior rigor qual o estado das aquisições, quer de carácter individual, quer de carácter colectivo, nas diversas dimensões especificas que o jogo em si encerra e que efectivamente se perderam ou permanecem intactas. Está descrito na metodologia da motricidade que existem idades sensíveis para desenvolver determinada competência, e após esta janela se fechar o desenvolvimento torna-se irreversível.
Preocupa-nos também que competição vamos ter quando pudermos reatar, existem clubes num estado comatoso e alguns com desistências de atletas a passar a média nacional, que está fixada nos 60%. Teremos de aguardar o retorno à pratica para aferirmos todas estas questões. Mas estamos a trabalhar e confiantes.
Como se encontra o departamento de futebol de formação face à diminuição de actividade?
O departamento de Futebol está a funcionar em pleno. Planeia, ministra treinos com os atletas via zoom numa base diária, faz palestras sobre psicologia, nutrição, prevenção de lesões. Continuam a trabalhar intensamente no recrutamento de atletas. Estão também a finalizar o exaustivo processo de certificação FPF que será entregue no dia 26 deste mês e que nos permite, por exemplo, formalizar contratos de formação desportiva, evitando saídas a custo zero para outros clubes.
Há direitos de formação de jogadores formados no belenenses a actuar na B-SAD – na equipa principal, B e Sub-23. O Clube consegue receber o dinheiro?
Existem dezenas de atletas da nossa formação que nos últimos anos foram inscritos pela B SAD. Nunca o Clube até hoje conseguiu receber um único euro de direitos de formação dessa entidade. É de resto, em Portugal e no mundo, a única entidade que não nos paga os direitos de formação devidos. Neste momento, estão dezenas de processo de reclamação dessas verbas a correr contra a B SAD nas Comissões de Arbitragem da FPF. Não vejo outro caminho que não seja a B SAD vir a ter de pagar as várias centenas de milhares de euros que nos são devidos. Lá chegaremos.
Com o fecho das competições de formação, nomeadamente o campeonato nacional de juniores, temos assistido à fuga de alguns dos nossos jovens valores para clubes e sociedades desportivas, principalmente para o campeonato de Portugal e Liga Revelação. E os que não sairam estão parados a desvalorizar e a desmotivar devido à falta de competição. O que poderia ter feito o clube para manter alguns destes jovens?
Este ano tem sido trágico para todos os milhares e milhares de jovens que jogam futebol, não só no Belenenses mas em todo o país. Esta paragem terá custos ainda não quantificáveis ao nível do abandono e da saúde pública.
A geração de 2002, que são os miúdos que para o ano são juniores, deveria ser especialmente protegida pela FPF pois adivinha-se uma taxa de abandono sem precedentes.
Da nossa parte, temos feito vários planos de treino com todos os miúdos, de todos os escalões, que são monotorizados pelas nossas equipas técnicas. Não é a mesma coisa, mas permite haver uma esperança de regresso, uma luz ao fundo do túnel.
Relativamente aos juniores de 2º ano deixámos sair três miúdos que tinham propostas do Campeonato de Portugal e achámos por bem permitir-lhes poderem competir. No final da época, se estiverem satisfeitos nesses clubes, podem lá ficar ou poderão eventualmente voltar para fazerem a pré-época connosco se for essa a nossa intenção. Todos os outros continuaram connosco e acredito que para o ano teremos de novo, como sempre, uma equipa altamente competitiva no Campeonato Nacional de Juniores.
Não seria mais interessante ter incluído alguns jovens da casa na equipa principal como fez o Vitória F.C. em vez de jogadores na casa dos 30 anos sendo que estes nunca nos irão dar qualquer retorno financeiro?
O grande desígnio do nosso clube é colocarmos a nossa equipa principal de novo nos campeonatos profissionais e para isso temos de ter equipas competentes e experientes durante o percurso, sem prejuízo de casarmos esta realidade com a aposta na nossa formação. Actualmente temos muitos jovens da nossa formação no nosso plantel: Foles, Alex, Trabulo, Oliveira, Rodrigo, Marques, Correia, Sénica, Brazão, Garrido e vários miúdos ainda juniores que treinam regularmente com a equipa principal.
Em termos de direitos de formação, o clube está a ser ressarcido pelas dezenas de jovens que têm abandonado o clube nos últimos 5 anos?
Essa é uma das principais fontes de receita do Clube nos últimos cinco anos. O Clube recebe de todos os clubes a nível mundial para onde se têm transferido os nossos jovens, com excepção daqueles que foram para a B SAD que é a única entidade que não paga ao clube esses direitos e por isso, como já disse, existem dezenas de processos a correr os seus termos contra a B SAD na FPF.
Nos últimos anos o clube recebeu centenas de milhares de euros de direitos de formação de muitos dos nossos atletas que se profissionalizaram um pouco por todo o mundo, sendo certo que à medida que formos subindo de divisão vamos ser nós próprios a profissionalizar aqueles que mais valor mostrarem.
Dos actuais juniores do Clube, da geração 2002, que para o ano são seniores o que está programado para eles? Algum com capacidade para ficar no plantel principal? E os de 1º ano como será a próxima época?
Temos alguns juniores que serão convidados a integrar a nossa equipa sénior da próxima época. Quanto à nossa equipa de juniores da próxima temporada, entre os miúdos de 2003 que são este ano 1º ano de juniores, e aqueles que ainda são agora juvenis A, estamos certos de que faremos uma excelente equipa.
Qual foi a quebra registada no futebol de formação, ao nível de praticantes?
Podemos apontar para uma quebra no futebol infantil abaixo dos 14 anos na ordem dos 25%. Só no final desta temporada se poderá ter uma ideia precisa da taxa de desistência.
Como prevê o futuro do nosso futebol de formação nos próximos anos com esta paragem de praticamente duas épocas desportivas na progressão dos nossos jovens?
Não consigo fazer essa futurologia. Apenas dizer que os problemas serão transversais a todos os clubes em Portugal, mas acredito que poderá haver uma retoma rápida da prática desportiva em toda a sua extensão se clubes e federação derem passos assertivos e determinados nesse sentido.
Quais os maiores talentos que actualmente temos na nossa Formação?
Conheço com algum pormenor praticamente todos os atletas das nossas principais equipas dos Sub-15 até aos Sub-19 e o que posso dizer é que temos lá mais jogadores do nível destes cerca de quarenta que nos últimos cinco anos conseguimos guindar ao futebol profissional, e alguns até de nível superior.
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