É possível manter a aposta no Andebol e Futsal num momento em que o clube precisa de se concentrar no futebol e no regresso à I Liga?
Nesta fase da vida do Clube o nosso foco, para hoje e para os próximos anos, passa por conduzir a nossa equipa de futebol senior até à 1ª Liga de futebol profissional. É essa a vontade colectiva dos dirigentes, sócios e adeptos do Clube, que estão juntos neste desígnio, porque todos sabemos que só dessa forma teremos capacidade de garantir esse grandioso objectivo.
Durante esta caminhada parece evidente para todos que teremos de investir mais no futebol e de sermos mais contidos nas restantes modalidades.
No entanto, somos e continuaremos a ser um Clube eclético, pois as modalidades são ar que o Clube não se pode dar ao luxo de deixar de respirar.
No actual contexto e por uma questão de seriedade para com todos teremos de ser muito prudentes nas apostas que fazemos, e no final desta época teremos de tomar decisões verdadeiramente estruturantes na vida do Clube com impacto para as próximas épocas desportivas.
Vivemos numa sociedade em que a vergonha parece ser um valor perdido: as pessoas já não têm vergonha, encontramos sujeitos com um sorriso na cara e assento nas TV e apresentações nos jornais que são acusados das piores corrupções e das maiores dívidas e é como se nada fosse. Noutros tempos a sua família fechava-se em casa e não saía à rua, agora essas pessoas são tratadas como senhores.
No Belenenses somos diferentes e temos vergonha e portanto uma coisa é certa: o Clube andará sempre de cabeça erguida cumprindo com as suas obrigações e para que isso aconteça só há duas hipóteses: ou somos capazes de aumentar as receitas ou teremos de cortar a fundo nas despesas em prol de um objectivo maior.
Quando a sua Direcção chegou ao clube em 2014 o andebol estava a ter uma época fraca no campeonato e não se percebia o projecto para a modalidade. Nos últimos tem sido realmente feito um trabalho na secção que eu como grande adepto do andebol, muito me apraz. Qual o segredo e até onde podemos chegar?
Recordo-me que em 2015 íamos em último lugar no campeonato depois de umas épocas anteriores também pouco conseguidas. Estivemos em grande risco de descida nessa época de 2015/16, num ano de grande turbulência que vinha da época anterior, com uma estrutura dirigente da secção que apresentou a demissão na primeira adversidade, e teve de ser o nosso Vice-Presidente a assumir a gestão da modalidade num primeiro momento, a remodelar a equipa técnica e o plantel, e mais tarde a organizar uma estrutura dirigente da secção que pudesse, nestes anos, ir sempre evoluindo a qualidade competitiva da equipa recrutando atletas de inegável valor, apostando num projecto assente no regresso de atletas com grande historial no Clube, com um passado de respeito e que vieram trazer, ao longo dos anos, carisma, espírito de grupo e um grupo com carácter.
O segredo tem sido esse: ter sido dada estabilidade a uma secção que vinha de muita turbulência, ter uma enorme capacidade de negociação no recrutamento de atletas e de técnicos que são escolhidos com grande critério, ter um grupo de trabalho com um ambiente de trabalho apetecível para quem está de fora, conforme consegui verificar pessoalmente quando acompanhei a equipa na viagem à Eslovénia para as competições europeias.
Um grupo que é apoiado fortemente no seu dia-a-dia pelo vice-presidente Pedro Lourenço e pelo director Pedro Domingos e onde temos um projecto bem estruturado, pensado há vários anos, que teve o mérito de conseguir um plantel com muitos atletas com 10, 15 ou 20 anos de Clube, muitos ex-internacionais, e isso é meio caminho andando para o sucesso da equipa e da secção.
Até na formação, que andou muitos anos sem resultados visíveis, conseguimos nos últimos dois anos o apuramento para a Fase Final do Campeonato Nacional de Juniores (seis melhores equipas do país) tendo alguns desses atletas treinado regularmente com os seniores.
Registamos nestes últimos anos que muitos atletas de outros clubes, com outras condições financeiras, têm demonstrado interesse em representar o Belenenses, em integrar este grupo, e em apostar numa situação de acumularem a prática do andebol com uma actividade profissional durante o dia, preparando o seu futuro.
Por todas estas razões penso que o andebol tem tido um trajecto com um registo muito positivo nos últimos anos.
O futsal está em risco de descer de divisão. O que pode ser feito para evitá-lo?
O Clube nesta época reduziu o orçamento da modalidade de forma substancial e construiu um plantel de acordo com essa nova realidade e com as escolhas da equipa técnica. A opção foi por um plantel muito curto mas com 6/7 jogadores de campo de qualidade inegável, juntamente com alguns jovens com margem de progressão.
A época acabou por ser completamente atípica, já que tivemos duas fases durante a época que foram de uma constante e dura luta contra a Covid-19, com surtos generalizados em todo o palntel, que nos obrigaram a paragens de várias semanas que levaram a que a equipa fosse obrigada a disputar demasiados jogos num curto espaço de tempo, sempre com várias ausências de jogadores fundamentais. Se juntarmos a isso uma série de lesões prolongadas e sem precedentes em jogadores-chave encontramos aqui uma boa dose da explicação para a época muito sofrível que estamos a fazer.
Em Janeiro, com a mudança da equipa técnica, foi feita uma reestruturação do plantel, com a saída de um atleta (Ianderson) e a entrada de quatro reforços (Marinho, Nuno Oliveira, Coelho e Buzuzu) que vieram acrescentar qualidade, equilíbrio, profundidade e experiência ao plantel, para abordarmos a segunda metade da época com maior otimismo e lutarmos pela manutenção, sempre com o respeito orçamental que é nosso apanágio e com a consciência que temos de ser cumpridores com os nossos compromissos. Não vamos cometer loucuras como foram feitas no passado.
Estes factos, no entanto, não afastam a nossa responsabilidade e de quem dirige a modalidade pois já no ano anterior, onde não houve pandemia, os resultados foram também eles muito negativos o que nos permite assumir com toda a frontalidade que há um problema de fundo na estruturação da modalidade no Clube.
Estão previstas mudanças estruturais na secção de futsal, como pedido por um número considerável de sócios, ou apenas nos ficaremos pela mudança de treinador?
Temos toda a confiança nas pessoas que integram a Secção de Futsal, nomeadamente no seu director Ricardo Antunes e nas pessoas que fazem o acompanhamento do dia-a-dia das nossas equipas.
Como respondido acima, a questão da competitividade da modalidade no actual contexto ultrapassa em muito a questão do atleta A, do treinador B ou do dirigente C, é uma questão estrutural de uma modalidade que caminha a passos largos para que o seu campeonato principal seja profissional, com todo o grau de exigência operativa e orçamental daí inerente, fortemente sustentada por elevados apoios camarários, beneficiando de cedências gratuitas de pavilhões, ofertas de transportes para deslocações, pagamentos de inscrições e seguros desportivos, apoiadas também pela economia local ao nível de patrocínios e publicidade (algo que temos de melhorar muito) e que provoca muito desequilíbrio ou desigualdades competitivas.
Como já referi, o actual grupo de trabalho tem dado o seu melhor mas esse melhor não tem sido suficiente para o alcançar de resultados positivos apesar de que, com a chegada do técnico Tiago Guelho, as coisas terem tido ligeiras melhorias também fruto dos ajustamentos feitos no plantel com a chegada destes últimos reforços. Será com este brioso grupo que vamos lutar até ao último minuto do último jogo pelos nossos objectivos, embora saibamos que é uma missão quase impossível.
Independentemente do que possa vir a acontecer, fruto do processo de Certificação da Entidade Formadora da FPF, estamos a reestruturar a nossa formação e o caminho no futuro, em todas as modalidades, tem de passar por uma maior aposta na formação e em jovens com qualidade e margem de progressão, algo que já começámos a fazer este ano (por exemplo, com a aposta no Gerson, Telmo, Sandro, Mónica, André Cruz e Relvas que têm jogado com muita regularidade) mas que tinha sido descurado nos últimos anos.
Está previsto o Belenenses voltar a apostar no futebol feminino? Podemos vir a pensar em ter equipas femininas de futebol? O que falhou no passado?
Para o Belenenses o desporto não tem masculino ou feminino e a prova disso é que temos uma equipa de voleibol feminino e não temos seniores masculinos. Naturalmente, a cada momento vamos gerindo a situação consoante as oportunidades e, por isso, com realismo, temos de admitir que mesmo sendo algo que colocamos no horizonte como um objectivo, o Clube nos próximos anos não dispõe de meios financeiros e humanos para ter equipas femininas de futebol. Sabemos, no entanto, que essa tendência é crescente e, por certo, no momento em que nos for possível, seremos capazes de criar uma estrutura com a dignidade e grandeza que o nosso Clube merecem.
Este ano o Basquetebol está muito forte e com condições para subir á 1ªLiga? Como vê a evolução da modalidade dentro do clube?
O trabalho desenvolvido pela Secção de Basquetebol, sobretudo pelo Francisco Carvalho e pelo Rui Vasco Silva, tem sido fantástico, muito alavancado por uma aposta na formação que cada ano está mais forte e mais apta a alimentar os escalões acima, incluindo as respectivas equipas seniores masculinas e femininas.
Este ano estamos fortemente empenhados em subir da Proliga à Liga Placard, que seria uma grande recompensa para o trabalho de grande mérito da Secção de Basquetebol, da actual equipa técnica liderada pelo Sérgio Ramos e de um grupo de trabalho com muitos atletas com qualidade para disputarem a competição acima. Acredito que se esta questão da pandemia permitir vamos voltar fortes e motivados para conseguirmos esse objectivo nos jogos que faltam e que vão decidir a subida.
Qual o projeto atual do Belenenses para o Voleibol?
Temos um conjunto de dirigentes na Secção que nos dão todas as garantias de realização de um trabalho ponderado, dedicado e sustentado e tem existido uma aposta cada vez maior na formação. É uma modalidade com uma grande capacidade de autossuficiência orçamental, com várias atletas do plantel sénior que fizeram o seu percurso na formação do Belenenses e a aposta no futuro passa por reforçar esse projecto sustentado na formação e mantermo-nos esta época na 1ª Divisão Nacional.
Quando é que o futsal vai ter escola de formação abaixo do escalão de iniciados como todas as outras modalidades do Clube?
À data de hoje diria que o futsal, fruto do processo de Certificação da Entidade Formadora da FPF, para além dos escalões de sub-19, sub-17 e sub-15, também já tem os escalões de sub-13 e sub-11, em parceria com o nosso ex-treinador José Feijão, e a tendência poderá passar por, no futuro, poder reforçar-se essa aposta na formação. No entanto, temos de ter a noção da dificuldade em arranjar pavilhões na região de Lisboa, dos custos que isso implica, e do facto do futsal ser uma modalidade com um enquadramento socioeconómico onde se torna impossível a esses escalões de base serem autossuficientes ou gerarem receita que suporte as despesas com alugueres de pavilhões, subsídios dos técnicos, aquisição de equipamentos e outras despesas associadas a essas equipas.
// Leia a entrevista na íntegra: