O site oficial do Clube lançou um conjunto de perguntas ao coordenador das escolas de minibásquete do Belenenses (escalões abaixo dos 12 anos de idade), António San Payo Araújo, num momento em que o basquetebol belenenses se encontra em franco crescimento e reafirmação no contexto regional e nacional.

Na sua segunda passagem pelo Belenenses na qualidade de treinador dedicou os últimos cinco anos ao minibásquete e ao seu desenvolvimento. Quando chegou tinha uma mão cheia de atletas abaixo dos 12 anos e hoje o problema já não é a falta de atletas mas antes como dar aos cerca de setenta “minis” do Belém condições cada vez melhores. Haverá melhor balanço do que este?

Antes de mais quero agradecer a oportunidade que esta entrevista me proporciona para fazer um breve balanço do que foram estes cinco anos a coordenar o minibásquete do Belenenses.

Quando aceitei ser o coordenador do minibásquete do Belenenses a minha exigência passou acima de tudo pelas condições de trabalho, nomeadamente espaços para treinar. Com a larga experiência adquirida ao longo de muitos anos eu não queria potenciar condições existentes, só me daria gozo se tivesse condições para potenciar a minha experiência. Felizmente essas condições foram me proporcionadas, motivo pelo qual aceitei o desafio. Contudo convêm que fique bem claro que ninguém faz nada sozinho e que a colaboração dos treinadores e “monitores” de minibásquete que tive ao longo dos anos, foram decisivas para o crescimento verificado. Assim sendo quero aqui realçar o trabalho desenvolvido pelos treinadores que coordenei, com especial realce para a Rita Oliveira, que me acompanhou desde o primeiro ano e também para todos os outros como o Paulo Renato, a Inês Silvério, o Tiago Mina, o André Vieira, a Ana Roxo e no último ano o António Rocha, o Hugo Aurélio e as nossas monitoras que eram minis quando cheguei ao Belenenses a Matilde Santos e a Yumi Takei.

O balanço deste trabalho pode-se resumir do seguinte modo: neste momento o Belenenses tem para cima de 70 praticantes de minibásquete, no espaço de cinco anos passou a ter uma equipa de Sub-13, duas equipas de Sub-14 e duas equipas de Sub-16 masculinos e surgiram nos femininos as equipas de Sub-14 e Sub-16.

O San Payo é uma das figuras de referência no basquetebol e em particular no minibásquete nacional. É conhecido por ter ideias claras sobre o jogo e em particular sobre o desenvolvimento humano, físico e desportivo dos praticantes mais jovens. Ao longo desta meia-década no Belenenses conseguiu colocar em prática a sua visão?

A minha visão sobre a formação desportiva passa por duas ideias centrais: primeira, no minibásquete o mais importante é a criança e falamos de todas as crianças e não apenas das que nos parecem mais dotadas para a prática da modalidade; segunda na formação desportiva a competição não é uma finalidade, mas sim um forte meio um instrumento de aprendizagem para o jovem praticante. Quanto à pergunta penso que a maioria dos pais percebeu a minha mensagem e os treinadores e dirigentes com os quais trabalhei comungaram dos meus princípios.

Sendo certo que nenhum clube com basquetebol se estrutura correctamente de cima para baixo o trabalho realizado visou, entre vários aspectos, alargar a base de praticantes e, para além da formação desportiva e humana, desenvolver talentos desde cedo. Na sua perspectiva o minibásquete azul contribuiu para o crescimento em quantidade e qualidade dos escalões de formação no nosso Clube?

Em termos quantitativos, e que ajudam a sustentabilidade de secção, a resposta foi já dada na pergunta anterior com o aumento de mais 3 equipas masculinas Sub-16 e Sub-14 “B” e Sub-13 e o surgimento de duas equipas femininas resultantes do trabalho do minibásquete.

Quanto ao aspecto qualitativo, como diz o ditado “Roma e Pavia não se fizeram num dia”. Nada nos garante que a maior quantidade é logo sinónimo de maior qualidade, mas havendo trabalho sério e bem desenvolvido a probabilidade é certamente muito maior. Aqui penso que os resultados começarão a ser mais evidentes nos próximos anos, pois crianças que começaram com 8 e 9 anos só começam as ser referenciadas quando chegam normalmente ao escalão de Sub-14, mas isso demora 5 a 6 anos.

Outro aspecto fundamental do trabalho da equipa do minibásquete do Belenenses diz respeito à relação com as famílias, que são no basquetebol português uma realidade cada vez mais activa e chave para o desenvolvimento da modalidade. O Belenenses também conheceu desenvolvimentos nessa vertente?

Actualmente a formação desportiva no nosso país assenta no esforço a vários níveis das famílias. O basquetebol, nomeadamente o minibásquete não foge a esta realidade. Já o escrevi no site do Planetabasket onde tenho uma colaboração regular, que os pais, que se preocupam, que os seus filhos tenham uma formação desportiva são uns verdadeiros heróis, pois tem que sair dos seus empregos ir a correr buscar os seus filhos à escola, levá-los ao treino. Para além de pagarem uma mensalidade são eles que os transportam para os jogos, para além de exercerem muitas outras tarefas. Sem o apoio dos pais não é possível haver minibásquete. Também aqui penso que o Belenenses cresceu muito, e tive de uma maneira geral um grande apoio dos pais, principalmente, quando sentia que os seus filhos já estavam fidelizados.

Aos pais com quem mantive uma excelente relação e de quem guardo gratas recordações gostaria de reforçar a ideia que estes devem acima de tudo estar atentos ao facto dos seus filhos gostarem de estar no Belenenses e se estão a evoluir e desenvolverem-se. É por aqui que passa o essencial da formação desportiva. Não se devem preocupar tanto com resultados, estes surgiram certamente com o tempo e o seu crescimento. Também não se devem angustiar com algumas tristezas dos seus filhos fruto de perderem ou eventualmente não serem convocados para jogar. A vida sem dificuldades não existe, e faz parte da sua aprendizagem saber lidar com as contrariedades. É um acto de inteligência. Às vezes leva algum tempo aos pais, numa fase inicial, compreenderem esta dinâmica, mas assim que percebem, que tem de haver um compromisso, nomeadamente aos fins-de-semana nos jogos, tudo começa a fluir sem dificuldades de maior.

Dificilmente ensinaremos a noção de compromisso aos nossos filhos se não formos os primeiros a dar o exemplo.

O minibásquete não tem uma natureza essencialmente competitiva e essa é uma questão que fica clara para todos os jovens atletas e respectivas famílias ligadas ao nosso Clube. Em todo o caso é visível uma aproximação dos “minis” do Belenenses relativamente a clubes com resultados consolidados… Por exemplo, os nossos Sub-13M, que são fundamentalmente jogadores mini12 a contactarem pela primeira vez com o basquetebol competitivo, têm dado uma resposta à altura. Concorda?

Se considerarmos que ter natureza competitiva é vencer a todo o custo e que para se alcançarem vitórias vale tudo, nessa perspectiva o minibásquete do Belenenses não tem seguramente essa preocupação. Se considerarmos que nestes escalões a competição não é uma finalidade, mas um meio de desenvolvimento das crianças e que nestas idades devem ter igualdade de oportunidades; queremos que os nossos minis entrem para campo para darem sempre o seu melhor de si e isso é seguramente a aprender a ser competitivo e os resultados surgiram fruto dessa aprendizagem.

Aos poucos e dando tempo ao tempo vamos tendo sinais dessa evolução. Os nossos praticantes começam com mais frequência a serem chamados para os treinos de observação das selecções regionais. Aqui há a destacar o Miguel Reino que já esteve na selecção de Lisboa de Sub-14 e já foi convocado para observação da selecção nacional de Sub-15. Quanto à geração dos rapazes de 2006, que termina este ano o seu ciclo no minibásquete, é uma geração que daqui a dois anos, no seu segundo ano de Sub-14, se tiver condições de treino, estará seguramente a disputar fases finais de muitas competições. É sempre necessário dar tempo ao tempo.

Outra questão fundamental diz respeito à equipa de treinadores que coordena, e que junta técnicos com perfis diversificados, idades e experiências muito diferentes. Que trabalho tem sido realizado também no que se refere ao desenvolvimento das competências técnicas e humanas dos nossos treinadores de minibásquete?

Salvo uma excepção, na qual nem me quero focar, todos os treinadores e colaboradores que comigo treinaram, foram de enorme dedicação e tem o que é essencial para ensinar, uma boa relação com as crianças, o que é verdadeiramente decisivo. Há muito que eu digo que me é muito mais fácil dar conteúdo técnico a que tem jeito para lidar com crianças, do que ensinar a lidar com crianças quem até pode saber muito de basquetebol. Neste aspecto também o Belenenses tem crescido muito e há cada vez mais jovens e não apenas jovens a tirarem o curso do grau 1 de treinador.

Se não me falha a memória, desde que cheguei ao Belenenses já foram tirar o curso de grau 1 e ligados ao Belenenses, o André Viera, a Inês Silvério, o Tiago Mina, a Rita Oliveira, o António Rocha, e este ano temos mais três formandos, o César Pereira, o Filipe Rijo e o André Dias. Neste ano, ainda não foram tirar o curso, por ainda não terem a idade mínima, a Matilde Santos e a Yumi Takei, duas jovens de elevado potencial para serem treinadoras de minibásquete.

Como olha para os próximos anos do minibásquete, não apenas no que se refere ao Belenenses mas também numa visão mais abrangente?

Começo por responder relativamente ao panorama nacional. O minibásquete cresceu muito desde o início do século, contudo há constrangimentos que dificultam a sua evolução. Profundo conhecedor da realidade nacional muito poderia eu dizer sobre este assunto, pelo que me vou limitar a referenciar apenas dois aspectos: tem de haver por parte da modalidade a clara noção que a prioridade número um tem de ser a captação, atracção e fidelização de crianças ao minibásquete, se assim não for dificilmente o número de praticantes aumentará, até porque entre outros constrangimentos há dentro deste modelo de desenvolvimento da actividade desportiva um grande “inimigo” que se chama horário escolar. Muito mais poderia dizer, mas fico-me por aqui.

Relativamente ao Belenenses aquilo que seria o melhor elogio que me poderiam fazer era que o minibásquete continuasse a crescer seguindo a filosofia e princípios que tentei transmitir durante estes anos.