A pouco mais de duas semanas do início do Nacional de Andebol, o site oficial do Clube foi conversar com o Prof. João Florêncio, numa conversa que abordou o momento presente da modalidade e do Andebol azul. Prometendo uma equipa para trabalhar arduamente jogo-a-jogo com a ambição de se aproximar do topo, o técnico do Belenenses salientou a importância de tornar a fazer do Pavilhão Acácio Rosa uma fortaleza, pedindo aos adeptos que acreditem e garantindo que a equipa dignificará sempre a camisola que orgulhosamente enverga. E terminou não escondendo um sonho muito especial.
No início de mais uma temporada e antes de olharmos para o futuro, como foi o regresso ao Belenenses a meio da época passada?
Foi um regresso a uma casa onde fui muito feliz, onde fui muito acarinhado e que guardo com enorme reconhecimento. Nunca poderia deixar de corresponder, o Belenenses está no meu coração!
Esta terceira passagem pelo Belenenses tem a particularidade de ter o seu filho [João Florêncio Jr.] na sua equipa técnica. É a primeira vez que trabalham juntos? Foi um factor importante na sua escolha?
Eu e o João Jr. trabalhámos juntos no inicio da carreira do João, nos juvenis do Passos Manuel, e já nessa altura correu muito bem e fomos campeões nacionais. O João Jr. desde pequenito que andava “atrás das bolas”, falamos muito de andebol e identificamo-nos no conceito do jogo, e nos processos de treino a nossa cumplicidade é enorme e complementamo-nos na especialização e no conhecimento, falamos e discutimos tudo, aprendemos muito um com o outro. Trabalhar com o João Jr. é o prolongar para o dia-a-dia profissional de uma relação de pai e filho, de amor e respeito, foi sempre um desejo que alimentámos e o que mais poderíamos desejar do que concretizá-lo no clube que nos recebeu, acarinhou e nos promoveu?
O que encontrou de diferente neste regresso ao Restelo?
Muita coisa haveria a dizer sobre essas diferenças, mas destaco particularmente o realismo e controlo nas possibilidades financeiras, as dificuldades em alimentar a equipa sénior com atletas oriundos da formação e a descrença nas possibilidades competitivas que tem levado a um alheamento progressivo no apoio dos nossos adeptos.
Que condições de trabalho encontrou no Belenenses? A Secção e a Direcção do Clube têm faltado com algo?
As condições de trabalho são óptimas dentro das condições disponíveis! A Direcção tem sido inexcedível no apoio e no esforço para nos proporcionar tudo o que está ao seu alcance e, às vezes, até o que está para lá dele. Na Secção o esforço também tem sido fantástico e imenso, e seria bom que houvesse mais gente que se juntasse na organização de molde a melhorarmos a nossa capacidade de resposta às necessidades que muitas vezes se tornam decisivas. O Belém tem muita gente competente e experiente que, se fosse mobilizada e estivesse disponível para nos ajudar, poderia fazer a diferença.
Neste momento, vemos que o Belenenses operou uma pequena revolução na sua equipa com a manutenção de apenas quatro jogadores da época passada. A que se deve esta decisão, por opção ou por necessidade?
É um sinal dos tempos! Não tínhamos uma base de atletas com perspectivas de continuidade nem capacidade financeira para combatermos a concorrência que se tornou mais diversificada com a procura vinda do estrangeiro, mais aliciante para os jovens atletas que se evidenciaram no nosso campeonato, e nós tivemos vários que se afirmaram e deram nas vistas.
Não estando o plantel fechado ao dia de hoje, quais as expectativas em termos de fortalecimento do grupo até ao arranque da competição?
Estamos na recta final de constituição do nosso plantel e ainda temos algumas hipóteses que, se se concretizarem, nos deixarão mais fortes e competitivos. A nossa capacidade competitiva vai depender da homogeneidade da equipa que nos dê a possibilidade de jogar 60 minutos de alta intensidade. No andebol actual não é possível sacrificar atletas e aguentar o ritmo de jogo.
Nota-se na constituição deste plantel que houve um esforço para fazer regressar ao Restelo atletas que tenham passado pelo Pavilhão Acácio na sua formação. Até que ponto é importante esta identificação com o Clube?
Essa foi a ideia base e estabelecemos como princípio que deveríamos centrar os nossos esforços no reforço da nossa identidade, com atletas que passaram pela nossa formação e que estão dispostos a dar tudo para voltarmos a lutar por classificações que honrem o passado e levem de novo o Belenenses a posições de destaque e reconhecimento.
Também existe muita juventude no plantel. Até que ponto esta situação pode condicionar o desempenho da equipa? Gosta de trabalhar com jovens?
Os jovens que vão integrar o plantel foram escolhidos preparando o longo prazo. São os que nos parecem ter potencial que pode ser desenvolvido treinando num contexto mais evoluído, com atletas mais experientes e capazes, que vão aumentar o grau de dificuldade e consequentemente a sua evolução. Os jovens são o futuro e há que prepará-lo. O passado não muito longínquo do Belenenses, no qual me incluo, prova isso mesmo.
Do que já viu nestes primeiros dias de trabalho, quais as principais diferenças desta equipa para a equipa da época passada?
Neste momento esta equipa ainda não tem a capacidade competitiva da equipa que terminou a época passada, mas estou muito optimista. Se conseguirmos, como esperamos, concretizar alguns reforços e recuperar os lesionados que ainda não integraram a preparação, podemos constituir uma equipa muito forte!
Na sequência do que falámos até aqui, o que pode ambicionar o Belenenses em 2017/18? Quais os nossos objectivos?
Vamos trabalhar arduamente e jogar jogo-a-jogo. Queremos aproximar-nos do topo!
O que seria necessário para o Belenenses voltar a discutir os lugares cimeiros da competição?
Estabilizar o grupo de trabalho dando continuidade ao modelo de jogo e ao processo de treino, tornando-nos cada vez mais consistentes competitivamente. Melhorar significativamente a qualidade dos escalões de formação num contexto de desenvolvimento do modelo de jogo e de procura do jogador-tipo. Procurar e aliciar cirurgicamente atletas que tenham ou assumam o carisma do Belém e que tenham ambição. Recuperar o inferno do Acácio Rosa, devolvendo-nos aquele ambiente único de apoio incondicional e de enorme cumplicidade entre a equipa e os adeptos.
Uma das principais diferenças que certamente sentiu neste seu regresso tem a ver com a formação, que após uma considerável sangria perdeu muita qualidade nos últimos anos. Como analisa esta questão e o que considera que deverá ser feito nos próximos anos?
Essa é uma questão vital! No passado conseguimos constituir equipas competitivas nos escalões de formação com jovens de potencial elevado que integravam um plano progressivo de assimilação de um conceito de jogo, com a ambição de quererem vir a pertencer e a integrar a equipa sénior. Era aliciante jogar no Belém! Nos novos tempos andebolísticos vigora a lei dos poderosos e a política de terra queimada, aliciando tudo o que mexe, levando todos os que se destacam desde muito novinhos. Há que desenvolver formas de protecção internas e nos órgãos de competência, tornando o Belém na alternativa credível e competente, que seja aliciante para os jovens que se querem afirmar.
Há pouco falávamos das muitas mudanças no nosso plantel, mas a realidade é que várias equipas fizeram o mesmo, muito devido às inúmeras saídas de atletas portugueses para o estrangeiro. Estas vicissitudes têm a ver com o estado actual do Andebol em Portugal ou com os cada vez mais frequentes apelos que os atletas recebem de campeonatos mais ricos?
Creio que a resposta a esta questão está implícita na pergunta formulada, muitos jovens vão à procura da compensação financeira que lhes permita a afirmação profissional. As dificuldades económicas dos clubes portugueses tornam o mercado muito reduzido. A confirmar-se esta tendência de saída de atletas, vai ter efeitos devastadores no andebol português acentuando as já existentes assimetrias entre os clubes ricos e os outros.
No actual contexto da modalidade, acha que o Andebol está a perder peso e visibilidade em relação a outras modalidades de pavilhão?
Há muita coisa para mudar e melhorar no Andebol! Os riscos são reais e a falta de capacidade económica e financeira dos clubes é preocupante.
O que poderia a Federação fazer para ajudar os clubes, que são fortemente fustigados com despesas de arbitragem, de inscrições, de seguros, de taxas, de multas, de deslocações, sem qualquer comparticipação ou ajudas de custo?
Cabe principalmente à Federação e aos diversos agentes questionar e procurar caminhos que viabilizem os clubes dando retorno e satisfação aos adeptos.
Falando ainda de deslocações, faz sentido que uma competição cuja maioria das equipas são amadoras, cujos atletas são trabalhadores ou estudantes, tenha uma quantidade absurda de jornadas a meio da semana, que obriga esses atletas a tirarem férias, a faltarem ao trabalho ou à faculdade, para deslocarem-se centenas de quilómetros para a realização desses jogos?
Temos uma competição organizada para profissionais num contexto maioritariamente amador ou semi-profissional, completamente desajustada da realidade.
Qual a sua relação com as restantes modalidades do Clube? Ao dia de hoje ainda se pode falar em quintinhas nas modalidades do Belenenses?
Nunca me identifiquei com esse sentimento de quintinhas. Sempre tive excelentes relações com os intervenientes das diversas modalidades, de enorme respeito e solidariedade pelo trabalho desenvolvido em prol do Clube. Tenho relações de respeito mútuo e até de amizade com diversos técnicos e dirigentes das diversas modalidades. Desejo-lhes sucesso e afirmação!
Outra questão que é inevitável tem a ver com a falta de público nas bancadas do Acácio Rosa. Certamente que sentiu esta diferença. O que podemos fazer para contrariar esta situação? Qual a importância de sentirem as bancadas cheias?
Numa resposta anterior já abordei a importância que essa questão tem. O inferno do Acácio Rosa é determinante para a nossa afirmação e sucesso. Precisamos de fidelizar e normalizar hábitos e horários, e compreendo que não é fácil, sendo que este ano vamos apostar num horário mais cedo para facilitar a presença dos adeptos. Precisamos de passar a mensagem de que ganhar é possível quando estamos unidos, adeptos e equipas, mesmo nos momentos adversos. Precisamos de vitórias!
Que apelo faria aos sócios e adeptos do Belenenses no sentido de contrariar a falta de apoio nas bancadas? De voltarmos a ter um inferno nas bancadas?
O adepto do Belém é único porque é apaixonado pelo seu clube! Algumas vezes, muitas vezes, somos teoricamente mais fracos do que os adversários, mas sentir o vosso apoio torna-nos gigantes! Mesmo quando não conseguimos ganhar acreditem que faremos tudo, mas absolutamente tudo, o que está ao nosso alcance! Dignificaremos sempre a camisola que orgulhosamente envergamos!
Muito obrigado por esta entrevista. Para finalizar, há alguma mensagem que gostaria de deixar ou alguma pergunta que não foi feita e que gostaria que tivesse sido feita?
A mensagem que gostaria de deixar é a da promessa de dedicação e empenho total. Disse um dia que gostaria de voltar ao Belenenses para ser Campeão. Transmiti esse pensamento ao nosso Presidente quando voltei em Dezembro, na época passada. Mantenho esse sonho! Do sonho à concretização, por vezes, às vezes, é preciso acreditar que se podem reunir condições. Pode não ser já, agora ou no próximo ano, mas… um dia vai ser! Eu acredito!