Georgete Duarte, “a gazela de Belém” é um nome escrito a letras de ouro, não só na história do Belenenses (ela e Vicente são as nossa duas maiores lendas vivas) mas também do desporto feminino em Portugal. Podemos até dizer que teve ainda um papel social relevante, como mulher desportista. Na sua terra, foi a primeira mulher a usar calças, a sentar-se sozinha num café ou, pura e simplesmente, a correr e a saltar – sendo, então, muito criticada por isso.
A modalidade em que mais se distinguiu foi o Atletismo. Durante a sua carreira de uma década e meia, Georgete Duarte conquistou nada mais, nada menos, do que 46 títulos nacionais individuais. Esse registo formidável permanece como máximo de sempre até hoje, já 52 anos depois de ter encerrado a carreira – teve a sua festa de despedida em 11 de Setembro de 1958, no Estádio do Restelo, onde lhe foram tributados todo o carinho, respeito e admiração que amplamente merece! Nenhuma atleta Portuguesa foi tão medalhada como ela! Continua a ser a atleta com mais títulos em três disciplinas: 100 metros, 200 metros e Comprimento. Só nesta última, foi campeã nove vezes seguidas!
Aos títulos individuais, há que somar muitos títulos colectivos. No seu tempo, a Equipa Feminina do Belenenses, de que Georgete era o expoente máximo, ganhou 12 Campeonatos Nacionais e 13 Campeonatos de Lisboa! As atletas do Belenenses dominaram o panorama nacional nas décadas de 1940 e 1950 e Georgete Duarte foi o expoente máximo das raparigas azuis dessas equipas.
Georgete Duarte foi recordista nacional em dez diferentes provas: 60 metros, 80 metros, 150 metros, 200 metros, 400 metros, 800 metros, 80 metros barreiras, pentatlo e, ainda em estafetas! Contribuiu muito para o progresso do Atletismo Português: por exemplo, nos 200 metros, fez o record do nosso país descer 4 segundos (de 31,8 para 27, 9)!
Este assombroso ecletismo adquire ainda mais brilho, se lembrarmos que também no Salto em Comprimento, no Salto em Altura e no Lançamento do Peso conquistou títulos nacionais.
Era, pois, uma atleta completa, ágil, elegante, resistente, versátil e determinada! De resto, a sua capacidade e fibra de desportista ficou expressa no facto de, além do Atletismo, ter praticado diversas outras modalidades, como Ténis, Voleibol, Basquetebol (em que foi internacional) e Hipismo! Não espanta, assim, a admiração de que era objecto e que se mantém até hoje. Há anos atrás, na Salésias, verificámos o espantoso respeito com que Rosa Mota e Aurora Cunha se lhe dirigiam. Como que a uma mestra!
Fica ainda como imagem inesquecível de Georgete, autêntico ex-libris do seu perfil de atleta Azul, a maneira elegante e orgulhosa como, ornada de grande quantidade de medalhas por si conquistadas, marchava no grande desfile de milhares de desportistas (o maior jamais reunidos por qualquer clube Português) aquando da inauguração do Estádio do Restelo, em 1956. Juntamente com ela, iam outras figuras de extraordinário relevo na história do Belenenses, como o olímpico Rui Ramos, o grande jogador e treinador Augusto Silva, o capitão de equipa e internacional Serafim das Neves e (a transportar a bandeira) Francisco José Pereira, co-fundador do Clube e irmão de Artur José Pereira, o principal fundador. Todos eles viveram emocionadamente a transição das Salésias para o Restelo – as duas grandes “Casas” do Belenenses.
O Belenenses deve muito a Georgete Duarte e nunca a esqueceu. E muito menos ela esqueceu o Belenenses: em anos recentes, por exemplo, vimo-la na corrida “Das Salésias ao Restelo”. E, nessas alturas, não podemos deixar de sentir – além do respeito e gratidão – uma grande surpresa com a forma que exibe. Ninguém diria que aquela senhora decidida, hirta, cheia de vigor e de vitalidade tem já 80 e muitos anos. O facto é que não se trata de uma boa disposição ocasional. Georgete continua extremamente activa, dando aulas de ginástica no Pavilhão Municipal da Moita. Tantos de nós, mais jovens, com uma vida demasiado acomodada, quase coramos de vergonha perante um tal exemplo de vontade e de têmpera.
E nisso, Georgete Duarte repercute aquilo com o Belenenses que nasceu, cresceu e se fez grande, e que temos o dever de continuar e perpetuar!
JMA